Oficiais russos admitem esquema de doping para atletas olímpicos do país

28/12/2016 11:30

"Foi uma conspiração institucional", afirmou a diretora interina da agência nacional antidoping da Rússia, Anna Antseliovich, em entrevista ao New York Times.

 

Oficiais russos admitiram, pela primeira vez, que houve um esquema sistemático com participação do Estado para dopar atletas olímpicos do país. Em entrevista ao jornal americano New York Times, a diretora interina da agência nacional antidoping da Rússia, Anna Antseliovich, reconheceu o problema, que explodiu ainda em 2015, com as primeiras denúncias, e resultou na suspensão da federação russa de atletismo e sanções ao país nos Jogos Rio 2016. 

- Foi uma conspiração institucional - afirmou Antseliovich na entrevista ao NYT, divulgada nesta terça.

A reportagem do jornal americano traz informações sobre o esquema em que amostras de urina dos atletas eram manipuladas por um laboratório para encobrir o uso de substâncias ilegais. Operação que teria contado com o apoio de membros do Serviço de Segurança Federal - antiga KGB - e do vice-ministro do Esporte do país.

O governo russo vinha negando há meses a existência de um esquema. De acordo com a reportagem do New York Times, a mudança no tom é motivada pelo desejo do país de restabelecer a confiança de suas instituições esportivas no cenário internacional. Na entrevista, a diretora interina da agência antidoping russa fez questão de ressaltar que os principais líderes do esporte russo não estavam envolvidos no esquema.

No início de dezembro, a comissão independente da Agência Mundial Antidoping (Wada), estabelecida para investigar o caso russo, apresentou a segunda parte de seus trabalhos. No documento, comandado pelo especialista canadense Richard McLaren, há indícios de que o esquema russo tenha beneficiado mais de 1.000 atletas de 30 esportes olímpicos, paralímpico e de inverno. Relembre o escândalo do doping na Rússia

As investigações tiveram início após um documentário da TV alemã ARD, veiculado em dezembro de 2014, alegar que atletas russos estariam sistematicamente burlando o controle antidoping e que teriam apoio dos órgãos de fiscalização nacionais. Na reportagem, o atletismo era citado como o esporte que mais se beneficiava desta fraude.

Averiguações das autoridades competentes, assim como depoimentos como o de Yulia Stepanova, atleta delatora que ajudou a gravar vídeos que retratavam o crime, comprovaram as irregularidades. Uma devassa em documentos e contas bancárias de membros da cúpula da Federação Internacional de Atletismo (IAAF) provou o envolvimento do então presidente da entidade, Lamine Diack, assim como de seu filho e outros assessores. 

Diack chegou a ser preso em Paris e responde ao processo em liberdade, enquanto seu filho, Papa Massata Diack, ex-conselheiro da IAAF, é procurado pela Interpol. Outros profissionais da cúpula da Agência Antidoping Russa (Rusada), assim como da Federação Russa de Atletismo (Araf), foram afastados e também respondem na Justiça.

Desde o início das investigações da Wada, dois ex-funcionários do alto escalão russo morreram inexplicavelmente, enquanto outro fugiu para os Estados Unidos – ex-diretor do laboratório nacional antidoping, Grigory Rodchenkov foi o responsável por grande parte das denúncias investigadas pela Wada. 

Com o escândalo, a Araf foi suspensa de competições internacionais, e a Rússia teve apenas uma atleta autorizada a competir no atletismo na Olimpíada do Rio de Janeiro. O Comitê Olímpico Internacional (COI) deixou a cargo de cada federação internacional definir a participação de russos na Olimpíada, com todos os atletas precisando se submeter a um rigoroso processo de inscrição. O levantamento de peso, outro esporte com numerosos casos de doping de russos descobertos, não contou com representantes do país na disputa. Natação, canoagem, ciclismo, pentatlo, remo, vela e luta olímpica tiveram vetos individuais. O Comitê Paralímpico Internacional (IPC) foi muito mais rígido e baniu toda a delegação russa da Paralimpíada de 2016.

Em dezembro, durante reunião do Conselho Executivo em Lausanne, na Suíça, o COI decidiu manter a sanção internacional à Rússia. Caso esta posição não seja revista, cada atleta russo terá de provar que está livre de substâncias proibidas para disputar os Jogos de Inverno de Pyeongchang, em 2018, e cada federação internacional deverá entregar uma lista de atletas aptos aos Jogos na sua modalidade. No Rio, 271 russos foram liberados de um total de 389 inicialmente inscritos. Caso as sanções sejam mantidas até a Olimpíada de Tóquio, em 2020, os russos passarão pelo mesmo procedimento para competir no Japão. O atletismo do país, porém, pode ficar fora dos Jogos novamente.